terça-feira, 1 de novembro de 2022

O Cabeleira - resenha de HQ

     O CABELEIRA, com roteiro de Leandro Assis e Hiroshi Maeda, e arte de Allan Alex, publicado pela Editora Desiderata. Cheguei neste título por uma curiosidade de momento com assunto do cangaço e, sabendo por cima que o verdadeiro Cabeleira foi um personagem que antecedeu esse fenômeno social, fui conferir o tratamento e tive uma grata satisfação ao encontrar uma obra superlegal, bastante firme no estilo de narrativa visual e textual, com ação, comoção e reflexão pra dar e vender.

     Adaptação do romance de Franklin Távora, lançado em 1876, conta a história de José Gomes, um bandido que, junto com o pai e um comparsa, aterrorizam o sertão da capitania de Pernambuco com seus violentos assaltos, nos quais não são poupados padres, crianças, mulheres ou idosos. E os desenhos de Allan Alex entregam essa barra pesada: com traços próximos ao cartunesco, mas extremamente trabalhados com volume, densidade e proporção (que, pessoalmente, me remetem ao estilo de Laudo Ferreira em Yeshuah, título que adoro pra caramba, que já resenhei anteriormente), o universo visual da história é muito consolidado, tanto com violência gráfica ao gosto de quem curte um gore, quanto na composição do ambiente colonial pernambucano do século XVIII - este, a meu ver, o grande feito da obra.

     No prefácio, os roteiristas contam que o texto foi escrito originalmente como um roteiro para cinema, tendo sido selecionado para uma oficina com nomes destacados do meio para uma mentoria - a qual, como eles mesmos salientam, orientou pontos essenciais para deixar o personagem central mais sólido, resultando desse processo o que encontramos na HQ. De fato, a narrativa é muito fluída, a leitura envolve de um modo espontâneo, mas, curiosamente, achei que ainda se ficou devendo espaço para... o personagem principal (!), pois, mesmo conhecendo as origens de sua opção pelo banditismo ainda na infância e a dor de se separar do que lhe fazia feliz nessa idade, o Cabeleira não enfrenta dilemas ou conflitos interiores diante das crueldades que pratica. Na verdade, na hora que o dilema é posto à frente dele por uma importante figura do passado, ele é interrompido com a presença de inimigos e levado ao conflito. Não deixa de ser uma constatação realista (quem briga tanto pela própria vida mal consegue refletir sobre ela), mas, de verdade, a história é tão legal que merecia umas páginas a mais apenas para essa revelação do "verdadeiro Cabeleira", já que, a bem da verdade, a trama toda parece sinalizar esse momento.
     Mas isso é uma observação de quem apenas queria mais leitura ainda porque é uma HQ demais, que vale a leitura deveras!

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